A chamada substituição tributária “para frente”, fundada no princípio da praticidade da tributação, visando rapidez e segurança no controle e cobrança dos tributos devidos, foi consagrada na Constituição Federal pela Emenda Constitucional no 3, de 1993, ao introduzir o parágrafo sétimo no art. 150.
Art. 150
“§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de impostos ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.”
A maioria dos Estados e o Distrito Federal interpretaram o trecho final do art. 150, § 7º da Constituição Federal: “assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido” no sentido de que seria assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do imposto pago por força da substituição tributária somente quando o fato gerador não se realizar pela inocorrência de operação subsequente por motivo de perda, roubo, quebra, extravio, inutilização ou consumo de mercadoria.
Posteriormente foi publicado no DOU de 27.03.97 o Convênio ICMS n° 13/97 que estabelecia na Cláusula segunda o seguinte:
“Não caberá a restituição ou cobrança complementar do ICMS quando a operação ou prestação subsequente à cobrança do imposto, sob a modalidade da substituição tributária, se realizar com valor inferior ou superior àquele estabelecido com base no artigo 8º da Lei Complementar 87, de 13 de setembro de 1996. “
A interpretação do Convênio ICMS n° 13/97 pelo STF afastou a possibilidade do contribuinte substituído ter direito a restituição de quantia cobrada a maior, nas hipóteses em que a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida. No julgamento da ADI 1.851/AL, Relator Ministro Ilmar Galvão, o Plenário desta Corte, por maioria, declarou a constitucionalidade da Cláusula Segunda do Convênio ICMS 13, de 21/3/1997, por entender que no regime de substituição tributária das operações subsequentes a presunção de valor feita antes deveria ser considerada definitiva, por isso, impossível a restituição dos valares pagos a mais pelo contribuinte.
Os Estados de São Paulo e Pernambuco autorizavam a restituição dos valores cobrados a mais pelo sistema de substituição tributária e não fizeram parte do Convênio n° ICMS 13, de 21/3/1997.
É importante ressaltar que o STF no RE 593.849/MG mudou o seu entendimento e fixou tese jurídica ao Tema 201 da sistemática de repercussão geral:
“É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”.
A orientação jurisprudencial fixa o marco temporal para aplicação do entendimento fixado no aludido RE a partir da publicação da tese da decisão em meio oficial, isto é, 24.10.2016, data em que foi publicada no DJE a Ata de Julgamento contendo a ‘tese’ de repercussão geral fixada pela Corte.
O ministro Luís Roberto Barroso ressaltou que atualmente o Fisco tem a possibilidade de apurar a operação real, não devendo a presunção de valor feita antes ser considerada definitiva e sim provisória, por isso, possível a restituição dos valares pagos a mais pelo contribuinte.
Para ele, quando o regime foi introduzido pela EC 3/93, a lógica adotada foi de que no estágio em que se encontravam o sistema de administração e fiscalização tributária era inviável a apuração do valor real da venda. O ministro também afirmou que a via é de mão dupla, da mesma forma que o contribuinte pode ser ressarcido, também o Fisco pode cobrar a diferença se o valor presumido for menor do que o real.
O instituto da repercussão geral, não possui efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Executivo, ao passo que somente possuem este efeito a súmula vinculante, as ações diretas de inconstitucionalidade e as ações declaratórias de constitucionalidade, nos termos do disposto no § 2o do artigo 102 e no artigo 103- A, ambos da Constituição Federal de 1988 e vários Estados continuaram assegurando ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do imposto pago por força da substituição tributária somente quando o fato gerador da operação subsequente não se realizar por motivo de perda, roubo, quebra, extravio, inutilização ou consumo de mercadoria e não aplicaram entendimento do STF no RE 593.849/MG.
A princípio o Estado do Rio de Janeiro veda ao contribuinte se utilizar do disposto no art. 10 da Resolução SEFAZ n° 191/2017 que trata de do indébito de ICMS, quando se trata de ICMS retido por substituição tributária na hipótese de o valor de venda ao consumidor final ser inferior ao valor da base de cálculo presumida. As disposições dos arts. 17 e 18 do Livro II do RICMS-RJ/00 e do art. 16 da Resolução SEFAZ nº 537/12 não contemplam esta hipótese.
Para os Estados aplicarem o novo entendimento do STF no RE 593.849/MG e adequar a ficção jurídica que ocorre quando do cálculo da base de cálculo de retenção do ICMS à realidade do processo econômico é necessário que através de lei ordinária alterem as suas legislações, de forma a evitar eventuais questionamentos sobre a legalidade da cobrança do valor recolhido a menor ou a restituição do imposto quando recolhido à maior, com fundamento no princípio da legalidade estrita, devendo-se observar duas hipóteses:
(1) quando a base de cálculo efetivamente praticada for superior àquela presumida, deverá ser recolhida a diferença entre estes valores; ou
(2) quando o preço praticado for inferior àquele presumido, será devida a restituição da diferença.
Há pouco tempo o Estado do Rio de Janeiro através da Lei 9.198/2021 passou aplicar o novo entendimento do STF no RE 593.849/MG.
A LEI Nº 9.198, DE 8 DE MARÇO DE 2021, publicada no DOERJ de 09/03/2021 acrescenta o art. 28-A à Lei n° 2657/96, de 26 de dezembro de 1996 e determina que o contribuinte substituído apure, a cada período de apuração, a somatória de todos os valores restituíveis, relativamente aos fatos geradores ocorridos com base de cálculo inferior à presumida, e também de todos os valores devidos, correspondentes aos fatos geradores em que a base de cálculo efetivamente realizada foi superior àquela presumida.
A diferença entre os valores restituíveis e os devidos resultará no valor a recolher ou a restituir naquele período de apuração.
A sistemática prevista no art. 1º desta Lei se aplica:
I às antecipações de pagamento do fato gerador presumido realizadas após 24 de outubro de 2016; e
II aos contribuintes que ajuizaram, até o dia 24 de outubro de 2016, ações judiciais com objeto especificamente coincidente com o do tema nº 201 do repertório de casos de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (“Restituição da diferença de ICMS pago a mais no regime de substituição tributária”), nos termos da modulação temporal fixada no Recurso Extraordinário nº 593.849/MG;
III inclusive aos contribuintes optantes pelo Simples Nacional.
O detalhamento da lei será feito através de decreto no prazo de 90 dias, após sua publicação. Estas novas regras irão impactar os estabelecimentos dos contribuintes substituídos que vendam para consumidor final.
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Ana Cristina Martins Pereira. A autora é advogada tributarista, especializada em defesa de autos de infração de ICMS, Pós-Graduada em Direito Tributário pela ESA – Escola Superior de Advocacia. Consultora jurídico/tributária. Sócia fundadora da MG Treinamentos. Professora da Escola fazendária do Estado do Rio de Janeiro. Palestrante do CRC-RJ e SESCON-RJ. Autora dos Livros: Regulamento do ICMS/RJ Anotado e Regulamento do ISS do Município do Rio de Janeiro Anotado e Desenvolvedora de conteúdos para o departamento fiscal das empresas.